Reconstituição do meu ser
Ser tão verde vermelho, brava gente!
Currais de gado cheiram as minhas
narinas
Sol do sertão-verões quentes
Redondo sol
Redonda lua
Ramos de Graça
Reconstituição do meu ser
Ramos de flamboiants
Vermelhas pétalas que coalhavam o céu e
o chão da minha terra
Cor do sol ardente
Minha alma sequiada de saudades
Rio de poças d’água
Kalilândia dos anos 60
Descalças ela e eu
Formas desenhadas explodem do inconsciente
de menina
Brilhos do circo Nerinho
Festões de Natais-Armarinho Aurora
Cores reluzentes dos meus sonhos
Enxovais de noivas de Olga da Princesa
Bordados à mão por Helena Caribé
Toalhas de linho marcadas de ilusão...
- Ramos dos fios lacerdinhas
Feira infestada era noite de boca em
boca, pele em pele
Praça de matriz enfeitada
Em volta do coreto
Ciranda impregnada de amores
Filarmônica 25 de março
Voltas e mais voltas para procurar o
hoje
Onde todos foram?
Impalpáveis aqueles dias.
Bandeirinhas de cores translúcidas que
me arrepiavam
Enfeitavam festas de fogos e
folguedos...
Convulsões de alegria.
Néons da Rural Wilys de Juca Dias na
Praça da Bandeira me alucinavam
Tomara que chova para brincar de
barquinho de papel e fazer bonecos de barro
Bairro da Kalilândia forrado de saibro
amarelo, caramelo!
Massas, magma de minhas primeiras
experiências...
Barro frio e gostoso que me sujava os
dedos, as mãos, o corpo...
Me lambuzava de vida... Causa de muitas
surras.
Pisava naquele amálgama com vontade de
integrar-me a ele,
Ser ele mesmo...
Ser matéria para ser arte.
Fazer arte para ser inteira.
Furar o solo branco com ferro duro,
Desenhando formas geométricas,
arriscando ferir o pé,
Desenhando formas geométricas,
arriscando ferir o pé,
Para ver o sangue vermelho pintar a
terra...
Santa Clara clareou
São Domingos me alumiou
Vai chuva, vem sol,
Enxugar o meu lençol
- Tomara que não chova
Pra brincar de roda, de pula-pula...
Pinto agora com a mesma despretensão
com que desenhava o solo de minha infância,
‘Proporcionando emoções sem tédio’
<>
Deixando fluir o meu interior sem
pensar em nada
O meu inconsciente foi meu mestre,
minha inspiração
Brincando, deixei passear a mão sobre
as telas:
Planos redondos e quadrados
Do meio por fim, me veio à tona, a
lembrança dos primeiros anos
Consciente estava desenvolvendo
pinturas que traduzem o ontem
Volutas desenhadas no meu chão
Chovesse ou não
De toda feliz!
Graça
Ramos
É formada em
Artes Plásticas pela UFBA, mestre em Artes pela Universidade da
Pensylvania (EUA), é Doutora pela Escola de Belas Artes da Universidade de
Sevilla, autora de publicações artísticas, membro da Academia de Letras de
Feira de Santana, professora da UFBA, foi diretora da Escola de Belas Artes da
UFBA.
Texto publicado no
Livro”Cultura e Artes Plásticas
em Feira de
Santana” em 2003.
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